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Singularidade no Método dos Elementos Finitos

O Método dos Elementos Finitos é uma ferramenta fundamental para projetos estruturais, visto que, com as mais variadas e complexas geometrias existentes, cálculos puramente analíticos não são os mais eficientes em boa parte dos casos.


Contudo, como sempre é enfatizado pela equipe Rampage, o conhecimento da teoria é fundamental para evitar equívocos na análise. Uma dificuldade comum se tratando do método são as singularidades.


Afinal, o que é uma singularidade?


Singularidade, de modo geral, está relacionado a um comportamento diferente do padrão, algo único.


Esse termo é amplamente utilizado em diversas áreas do conhecimento, encontra-se aplicações em matemática, física, mecânica estrutural, fluidodinâmica, entre outros.


Empregando o termo de maneira matemática (de modo bem simplificado), uma singularidade é um ponto onde a função ou a equação não tem um comportamento bem definido.


Um exemplo claro disso é a função:


f(x) = 1/x


Essa função está bem definida em todos os pontos, exceto para x = 0. Nesse caso, a função tende ao infinito, portanto, podemos dizer que x = 0 é um ponto de singularidade.


Na gravitação, um buraco negro é tratado como uma singularidade, pois se trata de uma enorme quantidade de massa concentrada em uma região muito pequena. De maneira prática, sua densidade e gravidade tendem ao infinito nesse local, portanto, as equações da física param de fazer sentido nessa região.

Figura 1: Singularidade buraco negro


E o que isso tem a ver com elementos finitos e análise estrutural?


Singularidades em elementos finitos.


Entendido o conceito, pode-se introduzi-lo no Método dos Elementos Finitos.


Muitos projetistas se deparam com altas tensões que não fazem sentido em sua análise, em boa parte dos casos se trata das singularidades, elas podem ocorrer por diferentes causas. Para não estender o texto, apenas um caso será analisado de forma bem detalhada, os outros seguem a mesma ideia.


Quinas afiadas, devido a rebaixos ou mudanças de forma na geometria, são candidatos a gerar singularidades. A peça abaixo (em aço estrutural) ilustra um exemplo:

Figura 2: Geometria com quina afiada


É importante elucidar que isso não é um erro do método, isso está previsto na teoria da elasticidade; se trata de um entalhe de raio 0. Como a tensão em elementos finitos é calculada dentro do elemento e não nos nós, sempre haverá uma distância da linha onde a tensão é infinita. Dessa forma, quanto mais refinada a malha, mais próxima dessa linha a tensão será calculada, aumentando sua intensidade e não convergindo.


Abaixo, será realizado um estudo, através de uma análise estática linear, ilustrando o que ocorre com a geometria quando a face posterior é fixada, restringindo todos seus graus de liberdade, e se aplica uma carga na face frontal:


Figura 3: aplicação das condições de contorno


A malha utilizada é composta de hexaedros de segunda ordem, elementos de ótima qualidade que garantem boa convergência. Três análises compostas pelos mesmos elementos, alterando apenas tamanho e quantidade foram realizadas nesse modelo. O comportamento esperado para uma geometria com tal malha é de convergência rápida, contudo, isso não foi percebido, como mostrado abaixo:


Figura 4: Tensões normais para diferentes tamanhos de malha.

Figura 5: Gráfico Tensão x Número de elementos


Pela análise das imagens, fica evidente que mesmo com uma malha de excelente qualidade, com quantidade mais que suficiente de elementos, a tensão segue subindo em ritmo acelerado, com um aumento de 14% e 10% respectivamente, não convergindo. Isso ocorre, pois a singularidade está presente, não importa quão refinada a malha seja, a tensão seguirá subindo pois ela tenderá ao infinito. O que é uma evidente impossibilidade.


Dessa forma, é válido ressaltar que a tensão da peça fabricada não tende a infinito como na análise numérica, isso porque, no processo de fabricação as ferramentas vão deixar um pequeno raio, que por menor que seja, é uma área que distribui a tensão. Nesse caso, o que ocorre é um concentrador de tensão, que nada mais é que um grande gradiente de tensão que ocorre em uma área pequena. É muito importante saber diferenciar esses termos. Em um concentrador, a tensão é bem definida, contudo, por se tratar de uma divisão de denominador pequeno (F/A), a tendência é um resultado elevado.


Uma dica valiosa é utilizar uma malha refinada nas regiões de concentradores, pois em uma malha grosseira o gradiente de tensão pode não ser bem captado. Portanto, a não ser que o projetista goste de viver perigosamente, obtendo um valor de tensão menor que o real, é fundamental ter cuidado redobrado nessas regiões.


O que fazer nesses casos?


Tendo posse desses conhecimentos, é importante o projetista lidar com esse problema. Uma abordagem possível é simplesmente ignorar a singularidade, mas somente se a região não for a de interesse. Isso por conta do princípio de St. Venant, que afirma que os efeitos das perturbações locais em campos uniformes de tensão permanecem locais, ou seja, ao se afastar, os efeitos podem ser desconsiderados.


Porém, na maioria dos casos, a região de singularidade é também a região de interesse. Simplesmente ignorar não é a abordagem mais recomendada.


Uma alternativa é acrescentar filetes na região, dessa forma, a linha passa a ser uma superfície, distribuindo a tensão e suavizando o caminho. É provável que um concentrador de tensão se forme nessa região, porém é mais previsível e seguro se trabalhar com ele, pois com uma boa análise, é possível prever de forma eficiente seu comportamento.


O estudo abaixo utiliza configurações próximas ao anterior, a diferença é a aplicação de um pequeno filete para aliviar a tensão.

Figura 6: Geometria suavizada

Figura 7: Tensões normais na geometria suavizada

Figura 8: Gráfico Tensão x Número de Elementos geometria suavizada


Já no segundo caso, percebe-se um padrão bem mais constante, com uma variação bem inferior a cada tentativa, variando menos de 1% na primeira e aproximadamente 3% na segunda. Vale ressaltar ainda que essa mudança ocorrida foi de redução, ou seja, o primeiro modelo é mais conservador, ao passo que no caso anterior (singularidade), o oposto acontece, a tensão segue aumentando, portanto, a iteração com malha menos refinada representa uma situação de menor intensidade que a realidade. Caso o modelo fosse para fabricação, provavelmente ocorreriam problemas.


Para fins comparativos, foi calculado de forma analítica a solução do modelo com o filete, visto que não se trata de uma singularidade.


A área da face retangular frontal é 50 mm x 100 mm = 5.000 mm2. A tensão normal é calculada dividindo a força pela área. Assim, σ = F/A = 10.000 N / 5.000 mm2 = 2 MPa. O fator de concentração de tensão pode ser encontrado pelo gráfico abaixo:

Figura 9: Gráfico fator de concentração de tensão adaptado de Shigley, Elementos de Máquinas, 8a edição.


O ponto vermelho na figura se refere à geometria utilizada, r/d = 0,1 e D/d = 1,5. Dessa forma, o valor do fator de concentração de tensão é aproximadamente 2,1. Como calculado anteriormente, a tensão normal é 2 Mpa, multiplicando-a pelo fator, temos aproximadamente 4.2 MPa. Comparando com o modelo numérico mais refinado (4,1793 MPa) encontra-se uma diferença de apenas 0,5% do valor teórico. Comprovando que o modelo é eficiente.


Nesse sentido, fica evidente que é preciso estar atento às singularidades, pois elas não condizem com a realidade. Na prática, o que pode ocorrer são concentradores de tensão, é fundamental entender bem o comportamento nessas regiões, principalmente para o caso de fadiga. Dessa forma, o cálculo não tem surpresas futuras e uma estrutura segura é garantida.


Para aprender de verdade o elementos finitos e não passar mais sufoco nas análises, nós da equipe Rampage Baja UFJF recomendamos fortemente que todos acessem o site do NCE e conheçam os cursos de treinamento profissional sobre o método, ministrados pelo professor, mestre e doutor Avelino Alves Filho, maior referência no assunto com 46 anos de experiência. São 5 módulos, sendo divididos em Análise Estática, Dinâmica, Não-Linear, Fadiga e de Software. Grandes nomes da indústria (Petrobrás, Embraer, Iveco, Mercedes, PSA, Ford, Caterpillar, etc.) utilizaram dessa mesma implementação de tecnologia CAE, agora disponível em EAD e idêntico ao presencial.


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